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Mostrando postagens de fevereiro, 2014

Lições do ano passado

Este é um texto que marcou para mim uma transição, um amadurecimento. Partilho agora, confiante de que sirva de ajuda para outros. Boa leitura. As férias deram-me sempre oportunidade para pensar na vida. Muito tempo disponível - e não preciso dizer mais nada sobre isso. O que me faz novamente me aventurar neste espaço de expressão, depois de algum tempo de jejum, é esta noite vívida de meditação que me dá humor e disposição para dizer algumas palavras. O assunto é a vida. Sei que não é aquele tipo de tema que conquista os olhos logo de imediato. Dificulta mais considerar que há muitos por estas bandas que ensaiam algumas poesias ou prosas sobre vida e acabam a tornando objeto de pensamento muito tedioso, quando não são as próprias letras dedilhadas dignas de bons bocejos. Mas a intenção aqui não é dramatizar. Do drama temos a dose suficiente no dia-a-dia. Nossas personalidades dão conta de tingir as horas com cores roxas e pretas. Quero me queixar da minha vida, mas, na pratica,

O que você quer ser quando crescer?

          Da infância à conclusão dos estudos somos rodeados pela pergunta "o que você quer ser?". Se acaso algum observador de outro mundo testemunhasse a freqüência com que ela é feita, talvez julgasse que a raça humana é dentre todas a mais preocupada com a formação de homens e mulheres eminentemente éticos ou, então, nos considerasse os seres mais existencialistas das galáxias. Entretanto teríamos de frustrar as conclusões do nosso observador alienígena e revelar-lhe que a interrogação, desde o início, tratava de profissão. A pergunta é se queremos ser médicos, advogados ou engenheiros, as três carreiras que efetivamente existem no imaginário popular. O resto é emprego. Mas não precisamos parar aqui e discutir vocabulário, podemos avançar até a próxima curiosidade sobre o modo como pensamos: que a pergunta companheira dos primeiros anos da vida cede lugar à urgência por ganhar dinheiro.           A escolha da expressão não é por acaso. Era possível escrever "traba

Tu e você

Desde a infância estranhei o uso de “você” e das formas da terceira pessoa que o acompanham. Enquanto eu aprendia com entusiasmo a dar nome às coisas e expressar minha vida interior aos outros, eu resistia à loucura de falar com alguém que estava diante dos meus olhos como se fosse pessoa ausente, a quilômetros de distância de mim. Eu fazia secreta objeção a tratar meus pais e meus amigos como completos estranhos. Pois eram essas as impressões que o uso de “você” me causava. O “tu’ era direto e íntimo, embora fosse muito complicado. Mas eu preferia dizer “Eu te amo” do que “Eu o amo”, “Eu a amo”, mais ainda do que dizer o atual “Eu amo você”, que é contra toda convenção gramatical. Não que eu estivesse ciente das normas e fosse um prodígio literário, ou um gramático esnobe maquiado de criança insolente. Era como eu dizia, o “tu” era próximo e imediato, chegava sem rodeios ao meu ouvinte, mas o “você” era distante e esguio, fazia ziguezague, driblava a atenção e chegava ao alvo sorrate

Não está fácil para ninguém

Popularizou-se a frase "não está fácil para ninguém" para expressar a dificuldade de arrumar emprego, ou manter-se em um, ou para falar das muitas dívidas e da falta de dinheiro para pagá-las. O povo diz isso, mas não é como se estivesse mais fácil antes. Problemas sempre existiram e a memória, quando consultada, pode servir de fiel testemunha. Mesmo o que hoje parece uma atividade tranqüila para nós exigiu-nos muito esforço e trabalho algum dia, como, por exemplo, andar, falar, fazer as operações matemáticas da tabuada. Acontece que a facilidade e a dificuldade não dependem tanto do número de desafios ou da complexidade deles, porém dependem muito mais do vigor com o qual os enfrentamos. O mesmo obstáculo pode obviamente ser mais desafiador para uns do que para outros,  mas o que não é tão óbvio é que, não obstante demandar mais força de alguns, o obstáculo pode parecer a esses mais fácil do que a outros. A diferença está na grandeza de alma e na generosidade dos que são de

Calor do verão

             Meses de janeiro e fevereiro e sentimos intensamente o que significa verão no país: calor, muito calor. Pomos os ventiladores para funcionar na velocidade máxima, senão para aumentar a sensação de frescor na pele, então para carregar aquele ar quente para outro canto do universo. Os mais remediados festejam o conforto do ar-condicionado, enquanto fazem segredo a respeito do amargor que preveem para a próxima conta de luz. Os banhos se multiplicam e, em raro acontecimento, a água gelada abandona o status de vilã que pega de surpresa para adquirir o de heroína que salva o dia. Aquela que, nos tempos indiferentes, serve de despertador para os embriagados é promovida a remédio doce e suave dos sóbrios desorientados pelo sol. Em muito tempo ela é bem-vinda e muito desejada. Há quem não possa contar com esses luxos e valha-se do que está à mão: não diria um leque, mas a capa duma revista, um pedaço de papelão, o calendário do ano passado. Quem sabe? Talvez seja a única ocasiã